Era uma tarde de outono e estava sentado entre estudantes ouvindo atentamente suas histórias de vida. Compartilhavam com alegria sobre como conheceram a Jesus e as mudanças que resultaram desse encontro. Como em todo grupo, ali estavam os mais falantes e entusiasmados, e aqueles que apenas ouviam atentamente os relatos.
Muitas vezes esses momentos guardam verdadeiros tesouros, experiências muito profundas e lições que podem nos marcar por toda vida. Foi o que aconteceu comigo, naquele país distante que estava visitando. Posteriormente, uma daquelas pessoas silenciosas se aproximou, pedindo para contar sua história.
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Aquela jovem médica fez seu relato, de forma tranquila e pausada. A cada frase eu ia me surpreendendo com a fibra daquele testemunho que nasce de uma profunda relação com Jesus, da plena confiança de quem sabe que sua vida está nas mãos do mestre, mesmo quando tudo parece indicar o contrário.
Nascida em uma família pobre de seu país, não teve em sua origem simples um impedimento para lutar por seu sonho profissional. Com a valentia típica de pessoas determinadas e muito esforço, ela conseguiu ingressar na Faculdade de Medicina. Durante o curso, passou a participar dos estudos bíblicos do grupo de universitários cristãos e ali tomou a decisão de seguir a Jesus Cristo.
Aquela decisão por Ele foi muito profunda e provocou, por um lado, uma mudança de valores e, por outro, a adoção de novos princípios que ela foi descobrindo nos Evangelhos. Tudo ia bem até o quinto ano do seu curso, onde um professor lhe apresentou a seguinte situação: sua aprovação na disciplina estava condicionada à concessão de “certos favores”. Acontece que, em seu país, os professores recebiam seu pagamento em função do número de alunos em classe e a reprovação aleatória era usada por alguns como forma de assegurar o rendimento. Ela recusou aquilo de imediato e, por isso, foi reprovada. E, pasmem: isso se repetiu por três anos consecutivos e fez com que ela, após haver cursado oito anos, abandonasse a faculdade para a qual ingressara com tanto esforço! Ela decidiu não abrir mão de seu compromisso com Jesus Cristo e assumiu o peso daquela enorme injustiça. Dois anos mais tarde, soube que aquele professor havia se aposentado. Assim, retornou à universidade e concluiu seu curso.
Ao iniciar a sua vida profissional, foi enviada para uma das regiões mais pobres de seu país para trabalhar em uma clínica do governo. Chegando lá, descobriu, dentre outras coisas, que aquele lugar era um dos principais centros abortivos da região; que os medicamentos enviados pelo Estado para serem distribuídos entre a população mais carente eram vendidos à população por seus colegas médicos, aumentando assim a exclusão e a miséria dos mais pobres daquela região.
Inconformada, ela escreveu uma carta de renúncia às autoridades médicas da região, indicando todas as irregularidades e a razão de estar deixando aquele posto, mesmo que isso lhe causasse problemas profissionais. No dia seguinte, seu superior lhe disse: “Não aceito a sua renúncia. Sua carta é agora seu novo programa de trabalho. A partir de hoje, serás a nova diretora desta clínica e pode iniciar o seu trabalho colocando em ordem os problemas que você mencionou”. Hoje, esta clínica é o centro de referência em saúde pública de seu país.
Naquele dia, aprendi que a coisa mais revolucionária neste continente latino-americano não é a ideologia. Descobri que a integridade é a coisa mais revolucionária na História, pois todas as vezes que encontramos líderes íntegros, independentemente de sua posição ideológica, os mais pobres são beneficiados. Descobri também que, como o profeta-estadista Daniel, quando cuidamos de nossa integridade em relação a Deus, ele mesmo cuida de nossa reputação.
Nos tempos em que vivemos, que bom seria se nossos líderes e ministérios fossem reconhecidos por essa característica. Certamente todos ganhariam. E, seguramente, os mais pobres seriam muito mais beneficiados.
Por Ziel Machado (Revista Liderança Hoje, Nº 1, Pág 72)